A poesia e a natureza das coisas

"Assim também ocorre com formas, sons e cores. A pedra triunfa na escultura, humilha-se na escada. A cor resplandece no quadro; o movimento, no corpo, na dança. A matéria, vencida ou deformada no utensílio, recupera seu esplendor na obra de arte. A operação poética é de signo contrário a manipulação técnica. Graças à primeira, a matéria reconquista sua natureza: a cor é mais cor, o som é plenamente som. Na criação poética não há vitória sobre a matéria ou sobre os instrumentos, como quer uma vã estética de artesãos, mas um colocar em liberdade a matéria. Palavras, sons, cores a outros materiais sofrem uma transmutação mal ingressam no círculo da poesia. Sem deixarem de ser instrumentos de significação e de comunicação, convertem-se em "outra coisa". Essa mudança - ao contrário do que ocorre na técnica - não consiste em abandonar sua natureza original, mas em voltar a ela. Ser "outra coisa" quer dizer ser a "mesma coisa": a coisa mesma, aquilo que real e primitivamente são" O arco e a Lira - Octavio Paz